quarta-feira, 15 de abril de 2015

A menina sem palavra, de Mia Couto



A menina não palavreava. Nenhuma vogal lhe saía, seus lábios se ocupavam só em sons que não somavam dois nem quatro. Era uma língua só dela, um dialecto pessoal e intransmixível? Por muito que se aplicassem, os pais não conseguiam percepção da menina. Quando lembrava as palavras ela esquecia o pensamento. Quando construía o raciocínio perdia o idioma. Não é que fosse muda. Falava em língua que nem há nesta actual humanidade. Havia quem pensasse que ela cantasse. Que se diga, sua voz era bela de encantar. Mesmo sem entender nada as pessoas ficavam presas na entonação. E era tão tocante que havia sempre quem chorasse.
Seu pai muito lhe dedicava afeição e aflição. Uma noite lhe apertou as mãozinhas e implorou, certo que falava sozinho:
— “Fala comigo, filha!”
Os olhos dele deslizaram. A menina beijou a lágrima. Gostoseou aquela água salgada e disse:
— “Mar”…
O pai espantou-se de boca e orelha. Ela falara? Deu um pulo e sacudiu os ombros da filha. “Vês, tu falas, ela fala, ela fala!” Gritava para que se ouvisse. “Disse mar, ela disse mar”, repetia o pai pelos aposentos. Acorreram os familiares e se debruçaram sobre ela. Mas mais nenhum som entendível se anunciou.
O pai não se conformou. Pensou e repensou e elabolou um plano. Levou a filha para onde havia mar e mar depois do mar. Se havia sido a única palavra que ela articulara em toda a sua vida seria, então, no mar que se descortinaria a razão da inabilidade.

A menina chegou àquela azulação e seu peito se definhou. Sentou-se na areia, joelhos interferindo na paisagem. E lágrimas interferindo nos joelhos. O mundo que ela pretendera infinito era, afinal, pequeno? Ali ficou simulando pedra, sem som nem tom. O pai pedia que ela voltasse, era preciso regressarem, o mar subia em ameaça.
— “Venha, minha filha!”
Mas a miúda estava tão imóvel que nem se dizia parada. Parecia a águia que nem sobe nem desce: simplesmente, se perde do chão. Toda a terra entra no olho da águia. E a retina da ave se converte no mais vasto céu. O pai se admirava, feito tonto: por que razão minha filha me faz recordar a águia?
— “Vamos filha! Caso senão as ondas nos vão engolir”.
O pai rodopiava em seu redor, se culpando do estado da menina. Dançou, cantou, pulou. Tudo para a distrair. Depois, decidiu as vias do facto: meteu mãos nas axilas dela e puxou-a. Mas peso tão toneloso jamais se viu. A miúda ganhara raiz, afloração de rocha?
Desistido e cansado, se sentou ao lado dela. Quem sabe cala, quem não sabe fica calado? O mar enchia a noite de silêncios, as ondas pareciam já se enrolar no peito assustado do homem. Foi quando lhe ocorreu: sua filha só podia ser salva por uma história! E logo ali lhe inventou uma, assim:
Era uma vez uma menina que pediu ao pai que fosse apanhar a lua para ela. O pai meteu-se num barco e remou para longe. Quando chegou à dobra do horizonte pôs-se em bicos de sonhos para alcançar as alturas. Segurou o astro com as duas mãos, com mil cuidados. O planeta era leve como um baloa.
Quando ele puxou para arrancar aquele fruto do céu se escutou um rebenta mundo. A lua se cintilhaçou em mil estrelinhações. O mar se encrispou, o barco se afundou, engolido num abismo. A praia se cobriu de prata, flocos de luar cobriram o areal. A menina se pôs a andar ao contrário de todas as direcções, para lá e para além, recolhendo os pedaços lunares. Olhou o horizonte e chamou:
— “Pai!”
Então, se abriu uma fenda funda, a ferida de nascença da própria terra. Dos lábios dessa cicatriz se derramava sangue. A água sangrava? O sangue se aguava? E foi assim. Essa foi uma vez.
Chegado a este ponto, o pai perdeu voz e se calou. A história tinha perdido fio e meada dentro da sua cabeça. Ou seria o frio da água já cobrindo os pés dele, as pernas de sua filha? E ele, em desespero:
— “Agora, é que nunca”.
A menina, nesse repente, se ergueu e avançou por dentro das ondas. O pai a seguiu, temedroso. Viu a filha apontar o mar. Então ele vislumbrou, em toda extensão do oceano, uma fenda profunda. O pai se espantou com aquela inesperada fractura, espelho fantástico da história que ele acabara de inventar. Um medo fundo lhe estranhou as entranhas. Seria naquele abismo que eles ambos se escoariam?
— “Filha, venha para trás. Se atrase, filha, por favor”…
Ao invés de recuar a menina se adentrou mais no mar. Depois, parou e passou a mão pela água. A ferida líquida se fechou, instantânea. E o mar se refez, um. A menina voltou atrás, pegou na mão do pai e 0 conduziu de rumo a casa. No cimo, a lua se recompunha.
— “Viu, pai? Eu acabei a sua história!”
E os dois, iluaminados, se extinguiram no quarto de onde nunca haviam saído.


terça-feira, 14 de abril de 2015


OS TRÊS AMIGOS (Anna Celina Outubro de 2014)

Era uma vez três amigos, diferentes em todos os aspectos. Popota, uma hipopótama que sonhava ser bailarina, Simão, o gorila que queria ser trapezista e Juvenal o sapo que gostava de cantar.
Eles eram os melhores amigos que podiam ser, e embora as diferenças entre eles fossem gritantes eles adoravam estar juntos. Popota e Juvenal amavam brincar na água, Simão não preferia ficar de fora deitado na grama só observando os amigos brincando. Mas o que ele mais gostava era de comer bananas, e outras frutas e junto com Popota fazia uma grande algazarra, subia nas árvores jogava as frutas para Popota que juntava todas e depois a sombra de uma mangueira se deliciavam enquanto Juvenal cantava uma canção. Juvenal por sua vez gostava de brincar de pula-pula com Simão ,Popota olhava e aplaudia as cambalhotas que ele dava, para segurança de todos era melhor ela ficar de juíza .E no fim do dia eles voltavam pra casa exaustos mas muito felizes.
Os dias passavam e a amizade dos três só crescia nada os afastava e ninguém entendia como eles tão diferente podiam se dar tão bem. Resolveram então segui-los para descobrir o segredo... Depois de alguns dias desistiram, pois não descobriram nada de diferente, apenas três amigos que gostavam de se divertir. E os três continuavam , brincando, lendo, contando histórias...
E de tanto ouvirem e verem os outros cochichando e apontando pra eles sempre que passavam, resolveram que fariam uma festa ,sim uma festa para comemorar a amizade. Distribuíram os convites, montaram uma mesa com muita fruta, sucos e doces bem na clareira próximo da lagoa. No meio da festa Popota fez uma apresentação de dança ,enquanto Juvenal cantava e Simão se equilibrava num arame. Todos aplaudiram e o show foi um sucesso, todos estavam se divertindo muito e Juvenal resolveu falar um pouco:
-No início de nossa amizade foi um pouco complicado, como dá pra ver somos muito diferentes, e nossas diferenças poderiam atrapalhar nossa amizade, Popota é muito grandona e desastrada, Simão tem muita energia e é trapalhão...
-E Juvenal é muito normal, disse Popota  arrancando risos de todos.
-É isso mesmo, mas nós nos amamos e nos respeitamos e isso é essencial na nossa amizade. Disse Juvenal ainda rindo.
-Nós respeitamos as nossas diferenças, por isso nos damos bem, disse Simão que foi abraçado por Popota...
-Como sou a maior, sempre vou na frente nas expedições que fazemos na mata. Disse Popota toda risonha.
-Eu, consigo subir nos galhos mais altos das árvores e pegar os frutos mais escondidos. Disse Simão estufando o peito.
-E eu, sou o primeiro a pular nos rios e lagoas, assim sei até onde podemos ir sem que meus amigos corram nenhum risco. Disse Juvenal ajeitando a gravata borboleta.
-E assim vamos vivendo, continuou Juvenal, respeitando os limites e convivendo com as diferenças de cada um.
Foram Muito aplaudidos...
Naquele dia todos voltaram para a aldeia pensando, como três amigos tão diferentes podiam dar uma lição de convivência e de respeito tão bonita.

Os três continuaram se divertindo, e já não pareciam tão estranhos para a aldeia, ao contrário tinha sempre novos amigos se unindo a brincadeira...

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Recomeço...

Bom Dia...
Esse é um novo momento,depois de muito tempo sem escrever,retomo essa atividade com esperança de que novas histórias brotem da cachola...

"Atrás de sete montanhas
Atrás de sete mares,
Bem longe daqui,
Existe uma lagoa bem azul.
No meio dessa lagoa há uma ilha bem pequena
Na qual cresce uma única árvore.

Ah, mas as folhas dessa árvore são de puro ouro
E brilham na luz do sol
Essa árvore tem muitos galhos,
Bem longos
E na ponta de cada galho há um ninho.
Esses ninhos estão cheios de ovinhos,
E dentro de cada ovinho...
Há um conto de fadas.
Eu fui lá e trouxe-lhes um.
Querem ver? , querem ouvir?
Era uma vez..."
(inspirado num começo para contos de fadas usado na Hungria)


Em breve estarei iniciando um projeto de retorno a lugares por onde passei e onde a vida me foi mais cara...
Boa Segunda feira